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Ainda diziam que o Saddam era pioneiro. Um macaquiinho de imitação!

Written By Sérgio Pereira on sexta-feira, 28 de janeiro de 2011 | 28.1.11


Aaaaah, como o mundo do jornalismo inventado é difícil! As exigências que semanalmente se nos apresentam, obrigando-nos a dar largas à nossa imaginação para criar textos alucinados e, com sorte, ligeiramente humorísticos, são um fardo pesado que mói os músculos da sabedoria fantasiosa. Por vezes, o cérebro não nos responde, num acto de rebeldia imberbe, deixando estes jornalistas em maus lençóis, a pensar como cumprirão os seus desígnios profissionais. Não raras vezes esses jornalistas precisam de umas férias relaxantes e revigorantes. Esta semana o destino escolhido foi a gigante ilha que é a Austrália, mais concentrado nos estados de Victoria e Queensland. A escolha muito se deve ao meu hobby favorito: olhar para cenários devastadores. Fica-se assim quando se cresce no Interior de Portugal.
A viagem adivinhava-se longa. Madrid – Londres, Londres – Nova Iorque, Nova Iorque – Los Angeles e finalmente de Los Angeles para Sidney. Tudo correu bem, excepto a última parte desta jornada com trejeitos de maratona mundial. A certa altura começou a sentir-se uma forte turbulência e, enquanto o Diabo esfregava um olho e coçava o rabo com a outra mão, os pilotos perderam o controlo do avião. O inevitável despenho deu-se numa ilha algures no meio do Pacífico. Após a profunda sesta em que o impacto com o solo me colocou, levantei-me e olhei em volta. Nada em meu redor, apenas um cenário paradisíaco com água limpa e areia fina à minha frente. Atrás de mim, árvores abriam caminho a uma densa selva. Era o único sobrevivente.
Entrei pela selva dentro, imbuído de um espírito aventureiro e de uma vontade de obrar dos diabos. Encontrei uma mulher sensual que se banhava nua num lago. O meu primeiro pensamento foi “Mulheres sensuais em ilhas desertas do Pacífico? Ora bolas, traumatismo craniano”. Mas quando ela se virou e começou a praguejar contra mim, percebi que ela era bem real. O inglês misturado com o espanhol e com aquela língua esquisita que os avatares falam denunciava-a: era uma guamesa.
Estava então em Guam. Ao menos não era uma ilha deserta, o que me dava hipóteses remotas de ir a tempo para a Austrália e ver as cheias. Mas tinha de ser rápido. Fugindo da mulher sensual que me perseguia com uma lança e uns seios rechonchudinhos badalão-badalão, prossegui pela selva. Todavia, rapidamente a minha corrida foi impedida. Um homem já de certa idade e com aspecto asiático interrompeu-me ameaçando de morte a minha vida. “Sushi kamikaze arigato karaté” foi o que percebi da sua sinfonia vocal desconcertada, muito provavelmente porque estas são as únicas palavras que compreendo de japonês, e tenho a tendência de cair em estereótipos desnecessários. “Oh homem de Buda, volte para o seu buraco e deixe-me lá passar que estou com pressa!”, disse-lhe visivelmente apreensivo. Mas a minha urgência rapidamente se dissipou, pois nada me fazia preparar para o que aí vinha. O japa não me deixou passar, pois se o fizesse eu ainda o ia denunciar aos “malditos dos amaricanos”. “Porque iria eu fazer isso?”, perguntei na mais profunda das inocências. “Então, isto em guerra vale tudo!”. Guerra? Esta sim apanhou-me de surpresa. Corria o dia 24 do mês 1 de 1972, e as guerras andavam longe deste lugar. A não ser a Guerra Fria. Mas que teria Guam a ver com a Guerra Fria? “Qual guerra fria, seu tuga ignorante? Estamos no Pacífico, isto está um calor que não se pode! Estou a falar da Segunda Guerra Mundial”. Ah bom, agora já faz sentido… espera, nem por isso. O quê? “Então, estamos em plena Segunda Guerra Mundial, não estamos? Aliados contra Alemanha e Japão?”. Ui, agora é que este me tramou. Então mas que estará esta figura aqui a fazer? “Então, eu estou aqui em guerra desde 1944, pois claro! Sou um orgulhoso soldado do Império do Sol-Nascente!!!”. Só me f****! O avião tinha mesmo que se despenhar nesta ilha, para ser eu a contar a verdade a este homem! Que mal fiz eu ao mundo? Só porque pego em notícias históricas, distorço-as ao máximo, enfio umas piadas lá pelo meio e chamo-lhe jornalismo? Não tenho culpa de em pequenino ter sido exposto durante longos períodos de tempo à emissão da TVI! Bem, vamos lá a isto: “Vai-me desculpar pelo que eu vou dizer, mas a guerra acabou”. A intriga tomou conta dos olhos bicudos do soldado. “Acabou há muito?”. Bolas, precisamente a pergunta que queria evitar. “Sim, acabou há… ora deixa cá ver… 3 e 6 18 noves fora nada… vai para uns 28 anos”. O choque, o horror, o arrependimento de dizer isto a um soldado de guerra com metralhadoras e granadas à volta da cintura. Pelo menos foi o que eu pensei assim que acabei a frase, mas a reacção do japonês foi o de se encostar a uma árvore, deslizar por ela abaixo até ficar sentado com os joelhos encolhidos, e começar a chorar que nem um bebé. Missão cumprida. Fui-me embora.
No geral, podem considerar-se umas férias positivas. Vi a maior quantidade de água enlameada da minha vida, e só precisei de abrir a torneira da casa-de-banho do hotel de Brisbane onde fiquei. Quanto ao soldado, nunca mais ouvi falar dele. E seguindo a lógica, talvez só oiça daqui a 28 anos. Agora é altura de voltar a exercer a minha profissão em força.
O quê, cheguei ao limite de texto? Pronto, olha, fica para a semana.

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