“Como vai ser hoje? Com o martelo ou com o bastão? Eu queria com porrada de três em pipa, mas infelizmente o Doutor Christian Hell reformou-se e só com dois barrigudos não há operação que se faça em termos”. Eram este tipo de comentários que até aqui todos podíamos ouvir, quando nos sentávamos à espera da nossa vez de ser anestesiados e posteriormente operados. Mas isso chegou ao fim. Tudo porque, na passada semana, num dia que nós podemos desde já afirmar em exclusivo que se situou entre Domingo e Segunda, o Dr. Crawford Long realizou pela primeira vez na história uma cirurgia com anestesia. A operação foi um sucesso como relatou a um jornalista menos dotado do que eu o Sr. Long – “A operação foi um sucesso”. Quando eu, e apenas eu, tive a sensatez de ver que só esta declaração não adiantava de nada, e perguntei ao excelentíssimo senhor doutor questões mesmo boas, ele respondeu “Foi um sucesso, porque o paciente cooperou connosco. Antigamente, por incrível que pareça, os utentes revelavam-se muito difíceis de operar! “AI, que dor enorme! VOU MORRER VOU MORRER!” eu estava farto de ouvir isto de mariquinhas que não aguentavam uma amputação de pernas, braços e uma orelha sem dar um espectáculo digno do Filipe La Féria. Mas hoje felizmente tudo correu pelo melhor”. Um jornalista muito belo e inteligente, que só mais tarde vim a perceber ser o meu reflexo num espelho, perguntou ao médico que tinha ele contra o Filipe La Féria. “Nada”- respondeu o doutor - “mas o pessoal do departamento de psiquiatria é capaz de não ter a mesma opinião que eu!”.
Quanto ao doente que foi operado, tinha apenas maravilhas a dizer. “Foi, simplesmente, mágico. Eu já tinha sido operado duas vezes, e lembro-me de não ter gostado. Especialmente quando me davam porrada até eu desmaiar ou me mandavam a cabeça contra um poste. Mas parece que tudo depende da pessoa que nos opera. Com o Dr. Long foi só levar uma vacina no rabo, dois os três sopapos (para dar sorte, disse ele) e pumba! Quando dei por mim, estava deitado com o meu pâncreas removido e a minha cara só medianamente negra!”.
Também as enfermeiras do hospital se revelaram muito satisfeitas, não tanto com este avanço médico, como com a minha disponibilidade de ir espreitá-las ao vestiário. Mas ainda assim estavam todas muito contentes, tirando, claro, aquela que insistiu em me denunciar à polícia.*
No que às anestesias diz respeito, estima-se que possam começar a ser distribuídas por todo o Mundo (e também na Etiópia) daqui a cerca de um mês. Até lá, aproveite caro leitor para se despedir do martelo de aço inoxidável com que costumava ficar a ver estrelas. Pode ser a sua última vez.
*Acabo de ler a queixa que foi feita. Afinal, TODAS as enfermeiras fizeram queixas de mim. Triste, muito triste... Uma pessoa tenta ser simpática e é assim que lhe agradecem!
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